quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

As coisas que não deveriam acontecer...



Esses últimos dias têm sido muito difíceis pra mim.
Não só como veterinária mas também (e principalmente) como pessoa. Como dona de animais fofos, queridos, amados e mortais.

Pode parecer meio sombrio isso tudo. Mas as vezes e na maioria dessas vezes, não estamos preparados para os acontecimentos naturais da vida.

Quando ganhei a Kika, en novembro de 2002 eu não tinha idéia, (ou talvez tivesse um pressentimento) do quanto ela seria importante na minha vida.
Ela era minha melhor companheira. Aonde eu estava a Kika estava também.

Ainda não sei se estou preparada pra tocar nessas lembranças tão maravilhosas mas ao mesmo tempo tão doídas.
Me sinto culpada, responsável. Fui tranquila demais sabendo que conheço meus animais tão bem. E errei.

Ela tinha olhos azuis e meio vesgos. A carinha e as patas bem escuras e o corpo de um dourado lindo. Era preguiçosa, gorda talvez pela castração em 2005. Foi mãe de 10 filhotes e uma ótima mãe emprestada pro Pascoal.

O Pascoal...

Tenho visto o quanto ele tem sofrido, o quanto tem procurado por ela por toda a casa. E o quanto ele tem precisado de mim. Agora, onde eu estou é ele que está.Cada cômodo que percorro pela casa é ele que me segue como se quisesse que eu descobrisse o esconderijo da nossa KIKA.

Procuro na cadeira do computador. Procuro sobre os armários da cozinha e até na minha cama. Nas cadeiras da mesa da sala ou embaixo dos cobertores do quarto de hóspedes. Mas ela não está em lugar nenhum.

E essa ausência me sufoca de tal forma que ainda não consigo aceitar a realidade.

Sempre falei que podia suportar a dor de perder qq animalzinho de estimação. Mas nunca ela. Fui injusta. Pq hj eu sei que também não suportaria perdê-lo.

Foram 6 anos (quase 7) de uma convivência intensa e realmente diária. O máximo que fiquei sem ela foram uns 7 dias. Portanto não sei o que fazer quando me der conta que esses dias vão aumentar e a cada novo dia o recorde vai aumentar esse vazio que sinto, ainda mais.

Ainda bem que eu sei o quanto beijei ela, amassei, o quanto curti cada momento, deixando ela deitar no meu colo pra assistir TV ou deitar nos meus pés quando cozinhava. Ainda bem que eu sei que toda vez que eu saía pra trabalhar ou qq outra coisa eu me despedia com um afago ou um beijo. E que nunca fui ruim com ela.

Mais do que por ser veterinária, eu a amava como dona apaixonada.
E de nada adiantou ser veterinária pq não pude trazer ela de volta pra mim.

No final, estou em pé de igualdade com qq pessoa comum. Que perdeu seu animalzinho de estimação tão querido e adorado.

Nesses últimos dias, repensei muitas coisas. E até pensei em extinguir esse blog.
Mas talvez eu precisasse tanto desse desabafo que optei por abrir meu coração aqui.
E optei por seguir escrevendo, como costumava fazer há alguns anos.

Esse hábito acabou sendo substituído pelas longas conversas (nunca mudas) com minha gatinha, que sim, respondia sempre pra mim.
Talvez e eu sei que é possível, nós sempre nos entendemos. E mesmo que suas respostas fossem miados eu sabia o que significavam.

Sempre soube.

Perdi minha companheira de viagens, de banhos, de sofá, de praia, de cozinha...Perdi minha conselheira de moda e minha ouvinte de choros e reclamações da minha terrível vida amorosa.

Perdi aqueles olhos vesgos e atentos a cada movimento meu. E eu não sei o que faço realmente.
Talvez simplesmente siga a vida convivendo com essa perda. Talvez eu adote outro gatinho. Talvez eu sonhe com ela todas as noites como tem sido nesses últimos dias.

E talvez eu consiga viver com essas coisas que nunca deveriam acontecer, mas que acontecem todos os dias.
Ainda tenho o Pascoal e a Cissa. E sei o quanto eles são importantes.

Mas a KIka sempre vai ser diferente. E sempre vai doer .

Eu não quis me despedir e não acho que tenha sido covarde. É que simplesmente eu não aguentaria. Simplesmente eu morreria ainda mais ali.

A única coisa que me deixa menos triste é saber que ela está bem perto de mim. A minha síndica, e ainda nem pude agradecê-la, deixou que ela fosse enterrada no jardim do meu condomínio.

Vai virar minha flor.
Ainda não fui até lá. Ainda está difícil, mas sei que poderei ir lá chorar minhas mágoas ou mostrar a roupa nova que eu comprei.
Posso me sentar ao lado do lugar em que ela sempre estará. E posso tentar acreditar que tudo tem um motivo pra acontecer. E que o destino talvez não tenha sido tão cruel.

Porque o destino me deu a KIKA um dia e ela realmente transformou minha vida.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Em 2009 mude!

Mude
Mas comece devagar,
porque a direção é mais importante
que a velocidade.
Sente-se em outra cadeira,
no outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair,
procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho,
ande por outras ruas,
calmamente,
observando com atenção
os lugares por onde
você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas.
Dê os Seus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.
Tire uma tarde inteira
para passear livremente na praia,
ou no parque,
e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas
e portas com a mão esquerda.
Durma no outro lado da cama...
depois, procure dormir em outras camas.
Assista a outros programas de tv,
compre outros jornais...
leia outros livros,
Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia
numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos,
escolha comidas diferentes,
novos temperos, novas cores,
novas delícias.
Tente o novo todo dia.
o novo lado,
o novo método,
o novo sabor,
o novo jeito,
o novo prazer,
o novo amor.
a nova vida.
Tente.
Busque novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.
Almoce em outros locais,
vá a outros restaurantes,
tome outro tipo de bebida
compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo,
jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado...
outra marca de sabonete,
outro creme dental...
tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores.
Vá passear em outros lugares.
Ame muito,
cada vez mais,
de modos diferentes.
Troque de bolsa,
de carteira,
de malas,
troque de carro,
compre novos óculos,
escreva outras poesias.
Jogue os velhos relógios,
quebre delicadamente
esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco.
Vá a outros cinemas,
outros cabeleireiros,
outros teatros,
visite novos museus.
Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só.
E pense seriamente em arrumar um outro emprego,
uma nova ocupação,
um trabalho mais light,
mais prazeroso,
mais digno,
mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre,
invente-as.
Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa,
longa, se possível sem destino.
Experimente coisas novas.
Troque novamente.
Mude, de novo.
Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores
e coisas piores do que as já conhecidas,
mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança,
o movimento,
o dinamismo,
a energia.
Só o que está morto não muda !
Repito por pura alegria de viver:
a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!


Clarice Lispector